quarta-feira, 24 de novembro de 2010

ADIVINHAÇÃO

AOP - Convém observarmos de perto alguns elementos utilizados pelos tchokwe no cesto de adivinhação. Uma das práticas utilizadas pelos ngangas (adivinhos) é a adivinhação mediante uma consulta que é feita por uma pessoa (cliente) que está interessada numa intervenção contra um mal (doença), seja ele físico ou social. Vai-se consultar o sacerdote e este utiliza vários processos de adivinhação, geralmente com objectos que simbolizam qualquer coisa.
A adivinhação na zona de Luanda é feita de uma maneira simplificada, usando apenas o muxakatu, pedaço de madeira talhado com várias ranhuras, onde é friccionada uma vara.
No nordeste de Angola ainda existe o cesto de adivinhação, o ngombo, e o adivinhador usa figurinhas esculpidas em madeira, as quais irão determinar a sorte do consulente.
Foram estas figurinhas, curiosamente, que vieram a inspirar a famosa figura nacional do Pensador.

O Pensador é hoje uma figura emblemática de Angola, que aparece inclusive na filigrana das notas de kwanza, a moeda nacional. É considerada uma obra de arte nativa fidedignamente angolana. Não o discuto, mas parece-me que, à semelhança de qualquer figura emblemática de um povo — como, por exemplo, o "Zé Povinho" em Portugal, o "John Bull" na Inglaterra ou o "Tio Sam" nos Estados Unidos —, o Pensador tem origem numa "tradição inventada" — como diria Hobsbawm — ou "convencionada". Na verdade, os primeiros pensadores angolanos foram esculpidos nas oficinas do Museu do Dundo em data posterior a 1947. Nesse ano, por iniciativa da Diamang, a então Companhia dos Diamantes da Lunda, foi criado na povoação do Dundo um museu de arte tradicional e de colecções etnográficas e arqueológicas. Os funcionários da Diamang, na maioria belgas e portugueses, chegaram a contratar artesãos locais e instalaram-nos em oficinas, incentivando-os a esculpir na madeira ou a modelar no barro figuras que fossem genuinamente "nativas", mas ao mesmo tempo interferindo no sentido de aproximar as formas de uma estética que julgavam ser mais convencional no sentido ocidental. Houve casos, por exemplo, de figuras míticas africanas cujos pés, seguindo a tradição, eram grandes e às quais foi reduzido o tamanho dos pés, por razões "de ordem estética". Creio que a invenção do Pensador angolano ficou a dever-se a um caso destes. Pegando em figuras do ngombo, o cesto de adivinhação dos lunda-tchokwe, os europeus induziram os africanos a criar uma figura que, de algum modo, se assemelhava a uma estatuária de origem grega, particularmente cara aos escultores europeus renascentistas, como Leonardo Da Vinci ou Rodin: o Pensador.

Nenhum comentário:

Postar um comentário